16/06/2009


ALGURES, NO DESERTO, O POVO SAHARAUÍ SOFRE E CONTINUA A LUTAR 

POR LIBERDADE 


http://www.fenprof.pt/Download/FENPROF/M_Html/Mid_183/Anexos/Sahara.pdf



À generalidade dos portugueses, a sigla R.A.S.D. nada diz, mas quer dizer República 

Árabe Saharauí Democrática. 

Contrariando regras elementares do direito internacional, o reino de Marrocos ocupou 

a maior parte do território da vizinha R.A.S.D., tendo nele construído um muro com um 

comprimento de 2.700 quilómetros de comprimento, instalando-se do lado “fértil”, onde 

existe uma importante reserva piscícola, bem como importantes jazigos de fosfatos, 

deixando para o povo saharauí apenas deserto. 


Vivendo nesses territórios não ocupados e, principalmente, em zonas fronteiriças um 

pouco menos inóspitas, que são já terreno argelino, o povo saharauí organiza-se nos 

seus acampamentos e, em condições quase limites, sobrevive. 

Dependendo quase exclusivamente da ajuda humanitária que lhes chega, os 

saharauís apostam fortemente na juventude e na sua educação e formação. Na 

R.A.S.D., encontrámos escolas, muitas escolas, e uma grande preocupação com o 

ensino e a educação das crianças e jovens. Por exemplo, no acampamento de Dajla 

há seis escolas que acolhem cerca de 3.000 alunos para os quais existem 476 

professores. As salas dos jardins de infância, nestes acampamentos, organizam-se 

por grupos etários. Sempre que possível, as escolas básicas têm um máximo de 20 

alunos por turma. As secundárias são apenas três para todo o território, o que exige 

que muitos jovens permaneçam longos períodos de tempo separados das suas 

famílias, em regime de internato. Uma delas, a Escola Secundária 10 de Outubro, para 

ficar equidistante dos acampamentos foi construída em pleno deserto, só sendo 

possível aí chegar de jipe e graças à perícia e extraordinária capacidade de orientação 

dos seus condutores. 


Aceder ao ensino superior só por solidariedade de alguns países, destacando-se três: 

Argélia, Líbia e Cuba. Nos acampamentos encontram-se, ainda, escolas de educação 

especial que se organizam por valências, havendo nelas professores com formação ou 

experiência que parecem fazer milagres. 

Cadernos, livros, demais material escolar chega pelos caminhos da solidariedade, não 

havendo outra forma de os fazer chegar. Formação de professores e seu 

acompanhamento em trabalho na sala de aula são também garantidos pela via 

solidária, encontrando-se muitos professores e formadores provenientes de Espanha, 

que dedicam as suas interrupções lectivas e, mesmo, as férias a esta causa maior e 

solidária. 


É este povo que vive nas suas “haimas” (tendas ou casas de adobe), que se alimenta 

do que há quando há (muitas vezes, há pouco mais do que chá carregado de açúcar 

para enganar a fome), que não tem estradas para chegar aos acampamentos, sendo, 

por isso, obrigado a atravessar areais imensos com muitos quilómetros de extensão, 

que pode acordar com uma tempestade de areia, recolher-se à tarde para escapar aos 

50 graus e deitar-se com uma tempestade diluviana, é este povo que continua a lutar 

pelo direito a ser feliz no território que é seu, mas foi usurpado pelo expansionismo 

marroquino. 


A riqueza existente no território saharauí é usufruída por Marrocos, quer através do 

acordo de pescas que a União Europeia ali mantém, permitindo-lhe pescar, só naquela 

costa, 900.000 toneladas de peixe por ano, quer extraindo fosfatos que rendem aos 

marroquinos, por dia, tanto quanto os saharauís recebem, por ano, em ajuda 

humanitária. 

É neste quadro, tão difícil e complexo, que o povo continua a lutar pela sua auto- 

determinação e exige a realização do referendo que, há quase duas décadas, foi 

decidido pela ONU, mas que Marrocos não aceita que se reja por regras justas e 

transparentes. Este povo exige, também, a libertação dos seus presos, exige saber 

onde se encontram os seus desaparecidos, exige poder circular em liberdade num 

território que é seu. 


Na manifestação realizada em 10 de Abril, p.p., junto do muro da vergonha construído 

por Marrocos para dividir a R.A.S.D., sobressaiam as mulheres e jovens que gritavam 

por liberdade, arremessavam pedras contra a tropa ocupante que se exibia do lado de 

lá do campo minado, arrancavam vedações feitas com troncos e arame farpado para 

dividir o território e separar as famílias… revoltado, um jovem, de bandeira 

empunhada, tentou colocá-la na zona proibida, para lá do arame farpado que já estava 

caído e pagou cara a rebeldia, sacrificando uma perna devido ao rebentamento de um 

dos engenhos assassinos colocados em terra que é sua. 


Eu vi, ali à minha frente, o desespero de tanta e tanta gente, gente como qualquer um 

de nós, que se lançava para cima das minas e que, apenas por sorte ou por ser de 

imediato agarrada não perdia ali a vida… senti, tão forte, a força que a luta pela 

liberdade transmite a cada ser humano e o apelo que lança a cada um dos que a 

procuram… aquilo é coisa que mexe connosco, que nos abala, que arrepia, que 

comove… naqueles momentos tão intensos, na nossa cabeça misturam-se emoções 

que se agitam com os gritos que enchem o silêncio daquele imenso deserto… 

Entretanto, o dia vai chegando ao fim e, por detrás das dunas, o sol começa a pôr-se 

lento e lindo…Olhá-lo é um momento único de paz, naquele espaço de guerra… A 

tranquilidade parece tomar conta do imenso areal, mas é aparente, pois o coração dos 

saharauís continua a fervilhar de razão e de razões… os nossos, solidários, decidiram 

entregar-se a uma causa que é nobre e que só nos pode orgulhar por a abraçarmos: a 

causa da vida, da vida humana, da vida condigna, da vida em liberdade! Como é 

possível, homens e mulheres sujeitarem outros homens e mulheres a tais condições?! 

Mas a verdade é que sujeitam… 

Num misto de Amor e Indignação, os nossos corações acompanham o pôr do sol e o 

caminho percorrido pela lua que vai tomando conta do céu… lua cheia… cheia de 

esperança num futuro que, solidariamente, nós portugueses e portuguesas, nós 

professores e professoras, temos a obrigação de ajudar a construir. 

Mário Nogueira 

Professor; Secretário-Geral da FENPROF 

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